02 - A Epístola aos Romanos
Parte 2
O perfeito juízo de Deus
Texto bíblico: Rm 2.1-16
Texto áureo: Rm 2.2
Introdução (Rm 2.1-4)
Se Deus vai julgar os que sabem dÊle apenas o que a graça comum permite (em Rm 1.21, o conhecimento de Deus citado é o que pela graça comum é comunicado a todos os homens indistintamente – graça comum é a porção da graça divina que é conferida a todos os seres humanos – At 14.17), quanto mais julgará os que foram alvos da revelação especial. Que, sabendo o que sabem, ao invés de lançar mão do arrependimento, possível pela bondade de Deus, praticam o que sabem ser condenado. Ter revelação especial é ter acesso à bíblia pela mediação do Espírito Santo, esses são mais indesculpáveis que os outros. Quanto mais a gente sabe mais nos tornamos responsáveis por nossos pensamentos e atos.
I- Os judeus de Roma se julgavam melhores (Rm 2.5-11)
No capítulo 1, Paulo descreve a ingratidão frente à graça comum que acaba por atrair o juízo de Deus sobre a sociedade; que explica porque os gentios vivem como vivem. Aqui descreve a ingratidão frente à graça especial que, também, deságua em juízo. Que povo tinha condições de cometer tal pecado? Os judeus, que detinham a revelação especial – as escrituras sagradas. Haviam muitos judeus em Roma. Como, provavelmente, a Igreja em Roma era oriunda dos judeus e prosélitos que, estando em Jerusalém no pentecostes, participaram da primeira grande conversão, voltando depois para Roma e estabelecendo a comunidade, era de se supor que estavam sob a pressão da sociedade judaica, principalmente no que tange ao cumprimento das tradições. Aqui o apóstolo denuncia a hipocrisia dessa comunidade. Em toda a carta os cristãos romanos serão advertidos quanto a pressão judaizante. O conhecimento especial não torna ninguém imune do juízo, pelo contrário, Deus não faz acepção de pessoas. Para Deus o que conta não é se possuímos o conhecimento especial, mas se vivemos de acordo com esse conhecimento.
II- Como os crentes de hoje, talvez (Rm 2.12-16)
A questão que se põe sempre, diante de todos os que arrogam possuir a revelação especial é sua coerência, e isso perpassa o tempo e as fronteiras de toda a ordem, de modo que todos somos colocados diante dessa questão: o que estamos fazendo com o que sabemos? Paulo aprofunda a questão afirmando que se houver alguém que não conhecendo tal revelação portar-se como se a conhecesse, isso lhe será benéfico no dia do juízo. Fica a advertência: saber sem viver não produz justificação. Ao fazer tais afirmações Paulo não advoga a salvação pelas obras, exalta a graça, pois só ela explica um gentio que sem lei vive a lei, assim como só a ausência da graça explica pessoas que proclamam a lei não conseguirem viver o que dizem crer. Graça não é a garantia de que se será salvo de qualquer jeito, mas a certeza de que se conseguirá viver o que tem de ser vivido. É o poder de Deus socorrendo-nos e levando-nos a ser o que em nós mesmos não o podemos ser. Examinemo-nos a partir de nossa vida para saber se estamos ou não sob a graça. Se o caráter não está sendo mudado à imagem do caráter de Cristo, a graça pode não estar atuando.
III- Aparência X Interior (Rm 2.17-21)
A questão do confronto entre aparência e interior é complexa, pois, ora se exalta que o que vai no interior é mais importante do que o aparente, pois, o interior fala da motivação e, muitas vezes, a motivação certa justifica o comportamento aparentemente questionável; ora, por outro lado, levanta-se a questão: que valor tem uma interioridade que não aparece nos atos ou, o que aparece nos atos não é a verdadeira interioridade ou, aparência é o que se tenta demonstrar através de adornos e discursos ou o que aparece nas ações concretas? É a questão que se põe aqui aos judeus: eles têm a aparência (forma de falar e vestir, cumprimento de rituais) de quem crê, mas um comportamento que denuncia um coração longe do que proclama os lábios. Qual é, portanto, sua verdadeira aparência ou o seu verdadeiro interior? E quanto a nós, como a cidade nos vê?
IV- O exagero com os cuidados rituais (Rm 2.22-24)
Paulo está falando da incoerência judaica, do fato de viverem o oposto do que proclamavam, produzindo, portanto, o contrário do proposto por sua missão de levar o conhecimento de Deus a todos os homens. Ao falar deles fala de todos os que, abraçando essa missão, não vivem à altura da mesma. Como é possível tal incoerência? Entre o que o explica está o exagero com os cuidados rituais, quando a forma substitui o conteúdo. Quando o participar de um ritual torna-se o fim da fé a incoerência se estabelece. Não há dúvida de que os sacramentos devem ser observados, porém, o centro do sacramento é o seu conteúdo, ou seja, o tipo de comportamento que quem participa do sacramento deve viver. E qual o grande problema da incoerência? A reação dos gentios, que, percebendo a hipocrisia acaba jogando nas costas de Deus a culpa. No tempo em que a carta foi escrita tudo o que acontecia com um povo era visto como competência ou incompetência de seu deus. Daí o porquê do nome de Deus 2
ser blasfemado entre os gentios. Como Paulo analisaria os tempos de hoje; a nossa influência sobre a cidade. O quanto temos sido diferentes dos judeus de então?
V- Os cuidados que devemos ter hoje (Rm 2.25-27)
Escreveu Gilberto Gil, cantor e compositor da música popular brasileira, criticando um religioso, de prática aparentemente duvidosa quanto à arrecadação de contribuição financeira entre os seus fiéis, que, no afã de demonstrar o seu ponto de vista sobre a questão da idolatria, chutou uma imagem de Maria Aparecida, tida pelos católicos como padroeira do Brasil: “Ele diz que tem, que tem como abrir o portão do céu/ Ele promete a salvação/ Ele chuta a imagem da santa, fica louco-pinel/ Mas não rasga dinheiro, não/ Ele diz que faz, que faz tudo isso em nome de Deus/ Como um Papa da Inquisição/ Nem se lembra do horror da noite de São Bartolomeu*/ Não, não lembra de nada não/ Não lembra de nada, é louco/ Mas não rasga dinheiro/ Promete a mansão no paraíso/ Contanto que você pague primeiro/ Que você primeiro pague o dinheiro/ Dê sua doação, e entre no céu/ Levado pelo bom ladrão/ Ele pensa que faz do amor sua profissão de fé/ Só que faz da fé profissão1”. Perceba o que Paulo está dizendo e que o juízo que o compositor faz do religioso salienta: ser impio não é ser incapaz de fazer um juízo moral. Seremos julgados, se não formos coerentes, pelos que nos observam. E mais, eles por não observarem em nós o comportamento que nós pregamos ser o correto, mais do que nos julgarem, sentenciarão que eles estão mais certos que nós. Nós devemos estar de olho na cidade para influenciá-la, sabendo que a cidade, também, está de olho em nós.
Conclusão (Rm 1.28-29)
A circuncisão foi o sinal que demonstrava que o homem e sua família faziam parte do pacto que Deus celebrou com Abraão (Gn 7.1-14), porém, diz Paulo, ela apontava para algo mais profundo, a circuncisão do coração, que implicava em mudança da natureza humana, se a circuncisão do coração não acontece, a circuncisão da carne perde o valor. Assim é o participar de todos os rituais de que participamos, se eles não falam do que está acontecendo em nosso coração, tornam-se por si mesmos vazios. O pior de tudo isso é que os que convivem conosco o percebem e, mais do que chamar-nos de hipócritas, desprezam o nosso Deus. Isso provoca sobre nós e sobre eles o perfeito juízo de Deus.
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1 Gil, Gilberto – Guerra Santa – cd Quanta – cd #1
* Noite de São Bartolomeu = 4/25 de agosto de 1572: assassinato em massa de protestantes franceses conduzido por nobres católico